sexta-feira, 30 de maio de 2014

É Ascensão, mas o Evangelho continua



A Solenidade da Ascensão do Senhor ocorre dentro das festividades pascais. É prenúncio da vinda do Espírito Santo que iremos celebrar no domingo de pentecostes. 
Na verdade, a Ressurreição, a Ascensão e o derramamento do Espírito em Pentecostes, são situações que nos remetem à reflexão de um mesmo e único mistério. A Igreja em sua sábia pedagogia, separou liturgicamente estas celebrações para que tenhamos mais tempo para aprofundar essa meditação. Daí que, é preciso entender que Jesus ressuscitou e foi para o seio do Pai. Ressuscitar é vencer a morte e entrar para a vida eterna, a vida que é o próprio Pai eterno. Deus é nossa vida, o céu é Deus.
Na Ascensão Jesus sinaliza que já está no céu quando nos diz: “Toda autoridade me foi dada no céu e na terra!” (Mt. 28, 18). Então, a Ele já foi dada a autoridade, não só da terra, mas também do céu! Assim, após a ressurreição, Jesus apareceu diversas vezes aos seus, no entanto já não estava mais fisicamente entre eles, agora já estava presente a partir do Espírito Santo.
Diante disso, para celebrar a Ascensão do Senhor é preciso perceber o sentido profundo que tem esta celebração para toda a Igreja e toda a humanidade. Algumas palavras de Jesus, enquanto ele ainda estava caminhando entre nós, pareciam como que codificadas, com uma compreensão ainda não muito clara. Algumas vimos domingo passado: “um pouco de tempo e não me vereis, outro pouco de tempo e me vereis novamente”, “vou para o Pai, mas permaneço convosco”. E assim, muitas outras passagens que certamente deixavam os discípulos, os apóstolos inquietados. Afinal o que ele quer dizer com isso?
Caríssimos, quando nós ampliamos nossa compreensão do mistério da Igreja, daquela mesma Igreja que nasce do lado aberto de Cristo, da Igreja que se põe na mesma missão de Jesus Cristo, na mesma missão do Pentecostes. Quando compreendemos este mistério pelas catequeses, pelas palavras do Apóstolo São Paulo, principalmente quando ele nos diz que a “Igreja é um corpo, onde Cristo é a cabeça e nós somos os membros” (Ef. 1, 22-23), a nossa compreensão vai se ampliando porque onde está o corpo está a cabeça, onde está a cabeça está o corpo. Não é possível um ser completo se a cabeça está separada do corpo e vice e versa.
Ora, se Jesus ressuscitado dos mortos, depois de quarenta dias caminhando entre os seus, manifestando-se, pregando como fazia antes, dando-se a conhecer, chegou agora ao final destes dias, ele volta para junto do Pai e, certamente, ele não volta mais da mesma forma que um dia do seio do Pai ele saiu. Sabemos muito bem que Jesus é o Verbo eterno de Deus, a segunda pessoa da Santíssima Trindade, Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro. Mas quando esta pessoa da Santíssima Trindade se encarna, assume a natureza humana, veste-se de um corpo humano, entre nós ele teve um nome: Jesus; também nos ensinou a chamar Deus de Pai, “meu Pai e vosso Pai”. Isso já nos coloca numa situação de antegozar aquilo que já nos está reservado diante de Deus, ou seja, a vitória já é nossa, Cristo ressuscitou. E quando ele voltou para junto de Deus, não voltou mais como verbo, mas voltou como homem Deus, portanto, levou consigo nossa humanidade. Assim sendo, a festa de hoje é a festa da humanidade em Cristo glorificada.
São Paulo também nos ensina o que é a fé. A fé é a certeza de já possuirmos aquilo que esperamos. Como é possível alguém já possuir aquilo que ainda espera? Sim, porque nós ainda não fomos glorificados em Deus, nós ainda estamos peregrinando neste mundo de incertezas, de dificuldades e uma série de coisas desafiadoras. A nossa glorificação final será quando estivermos face a face com ele.
Então, como é possível, nós já possuirmos aquilo que na fé ainda esperamos? A resposta é simples, os sacramentos que Jesus nos deixou são essa possibilidade, essa via de acesso que nos faz experimentar realidades das quais ainda não temos a plena posse. Por exemplo, a Eucaristia, nada mais é do que tornarmos Jesus presente em nossa própria vida. É possível tocá-lo, é possível vê-lo entre nós, sob os véus dos sacramentos. Não podemos com os nossos olhos, como os discípulos, como nos narram os Atos dos Apóstolos, não mais o vemos fisicamente, nós o vemos, nós o experimentamos, através desses sete sinais do seu amor deixados por ele a sua Igreja: Batismo, Eucaristia, Crisma, Reconciliação, Matrimônio, Ordem e Unção dos Enfermos. São todos sinais sacramentais da presença de Jesus no mundo, cumprindo aquilo que ele nos disse: “vou para junto do Pai, mas não vos deixarei órfãos. Eu vos darei um outro advogado" (Jo. 14, 15-20), por meio do qual continuarei a minha missão no mundo através de vocês. "Eis que estarei convosco todos os dias até a consumação dos tempos” (Mt.28, 20b).
São palavras que não nos permitem titubear, que não nos permitem duvidar, no sentido mais pleno da fé. A fé se interroga, é verdade. Toda fé viva se interroga; e quanto mais a fé se interroga, tanto mais ela se robustece, tanto mais ela avança. Nenhum de nós deve ter uma fé cega, existe a inteligência da fé. Como perscrutar mistérios que nos ultrapassam e muito, senão através desses sinais que Jesus nos deixam para nos fortalecermos na caminhada. A Eucaristia é de todos eles a forma mais iminente da presença de Jesus. Quando ele a instituiu ele disse, isto é daqui para frente o meu corpo entregue por vós, este cálice é o cálice do meu sangue que será derramado por vós e por muitos para a remissão dos pecados.
Deste corpo nós nos alimentamos. Neste corpo nós vivemos, nos movemos e somos. Em Cristo, portanto, vivemos, nos movemos e somos. A Razão maior da nossa existência na medida em que mergulhamos na fé neste mistério, somos como que possuídos por esta presença amorosa de Jesus que um dia nos fará, como ele, cabeça deste corpo, estarmos unidos no seio da Trindade. “Eu e o Pai somos um” (Jo. 10,30), nós faremos nossa habitação no coração de cada um de vocês. “Eu e o Pai somos um”, nós somos chamados a esta unidade perfeita que só será possível na eternidade.
Jesus no Evangelho deste domingo nos dá um mandato, antes de voltar para junto do Pai: eis que eu vos envio para evangelizar. "Ide pelo mundo inteiro. Toda a autoridade me foi dada no céus e sobre a terra. Portanto, ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo e ensinando-os o que vos ordenei” (Mt. 28, 19). Ouçamos então o mandato do Senhor e procuremos em nossos dias atuais os melhores meios para levar o anúncio da Boa Nova.

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